24.2.11

Feira do livro... negro

Decorre em Cuba a “XX Feria Internacional del Libro” que percorre diferentes províncias em diferentes datas. Na passada segunda-feira, 21 de Fevereiro, no âmbito do encerramento em Havana, realizou-se uma reunião de Fidel Castro com alegados intelectuais.

Com que ternura ouvimos uma figura destacada do regime, comparar Fidel Castro ao bíblico Moisés, no papel de “conduzir” o povo cubano pelo deserto ..
Não me parece completamente descabido comparar Fidel Castro com o interlocutor privilegiado de Deus – de algum lado lhe virá a legitimidade e, nesta fonte divina de autoridade, até Marcelo Caetano fingia acreditar. Mas comparar a nação cubana a um deserto, raia o insulto.

Que os castros tratem os cidadãos como se fossem camelos, é notório – comparável à forma como Muammar Kadhafi trata os seus por ratos de esgoto. Mas o que faria sentido era dizer que Fidel Castro conduziu os seus seguidores forçados... para o deserto.

Atendendo à cobertura que a Cubavision está a fazer da situação na Líbia – e também a Telesur – em defesa de kadafi, torna-se ainda mais pertinente.

Embaraçoso pode ter sido para muitos que na tal sessão de Fidel com os alegados intelectuais, um antigo combatente revolucionário, inesperadamente, tenha feito notar como eram jovens aqueles que fizeram a Revolução e que hoje continuavam ali mas com avançadas idades. Isto é, como a juventude está ausente daquelas reuniões!!!

Fidel, essa “raposa do deserto”, logo ali fez um pedido para que na próxima Feira do Livro, daí a um ano, portanto, trouxessem jovens àquela reunião. Na cabeça do "coma-andante", como lhe chamam, os jovens a que se referia eram certamente os provocadores que o partido mandou há dias para insultar violentamente as "mulheres de branco" (familiares de presos políticos) reunidas pacificamente em casa de uma delas.
Mas creio que na cabeça de todos os demais passou outra visão: daqui por um ano aquela sala estará cheia de jovens, talvez, mas sem nenhum daqueles velhos combatentes e muito menos um Castro.


A imagem inicial é uma montagem a partir de «Moisés» de Miguel Ângelo.

23.2.11

Democracia quê?

A subida dos preços dos alimentos, tratada no G20, e a subida dos preços do petróleo e do gás, decorrentes das crises políticas do Médio Oriente e norte de África, juntam-se aos problemas de dívida soberana com que se confrontam os países desenvolvidos da Europa e da América do Norte, especialmente.

São elementos demasiados e demasiado fortes para que se vislumbre uma solução. Para já não falar das divisões que provocam entre os países.

Por sua vez, a recessão nestes países leva a retrair despesas, isto é, investimentos, prestação de serviços, salários e empregos. As migrações tenderão a recuar para os países pobres de origem e as tensões farão sentir-se nuns e noutros por todas as razões mencionadas.

Retracção económica e conflitualidade social é o que se pode esperar nestas circunstâncias. Será que se encontrarão saídas satisfatórias para o problema económico, nomeadamente através de um “novo paradigma”?

Por enquanto, a recessão económica parece alimentar, por oposição, alguns avanços democráticos. Seguir-se-ão avanços mais radicais, isto é, respostas que vão à raiz dos problemas, à democracia económica?
Não parece que os poderes nacionais e transnacionais, políticos e económicos, estejam disponíveis para fazer esse caminho de recuo nas suas estratégias, antes pelo contrário, mas talvez seja porque a água ainda não chegou aos tornozelos.

21.2.11

O direito ao futuro


A falta de uma liderança das revoltas no norte de África e no Médio Oriente, sendo talvez a sua maior fragilidade é também a sua maior defesa. Os poderes estão habituados a fazer rolar a cabeça do inimigo, mas quando o inimigo não tem uma cabeça (ou não tem uma cabeça visível), os poderes ficam desnorteados.

É que as manifestações de revolta são motivadas pelo próprio Poder, estimuladas pela sua natureza despótica e incompetente para responder aos anseios mais primários da população.

Depois há outro aspecto que desorienta os poderes instalados: o caracter geral, elementar, das reivindicações – liberdade, dignidade, democracia. Com que argumentos se podem contrariar tais reivindicações?

Claro que nada disso impediria, como não impede noutras partes do mundo, que a força bruta fosse descarregada contra os manifestantes, enchendo de sangue as ruas e as praças. Mas aqui há duas contrariedades: a disposição das próprias forças armadas e as repercussões internacionais.

A destabilização interna, em última análise, seria aproveitada pelos “inimigos externos” com fortes motivações económicas. Não escapa a ninguém que se trata de países das regiões que fazem andar os motores do mundo.

Em última análise, tudo indica que para os clientes de petróleo e para a própria população descontente, sobretudo a mais jovem, é o seu futuro que está em causa.

Bem diz um provérbio chinês que «pessoas com diferentes sonhos podem partilhar a mesma cama».

20.2.11

Porque hoje é domingo (2)

Santidade! Perfeição! É o que nos pede Jesus no evangelho deste domingo 20 de Fevereiro! « Se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda! », diz Jesus.

«Mas o caso de oferecer a face esquerda para um tapa não devemos considerar ao pé da letra» - diz o padre.
Ao pé de um ataque de nervos é como me deixa esta homilia. Afinal, se Deus não quer dizer aquilo que diz, porque não diz aquilo que quer, simplesmente? Eu que já estava preparado para apoiar o José Sócrates apesar de todas as malfeitorias que me tem feito, desde a redução da receita até aos aumentos das despesas, vem o padre e troca-me as voltas. Ou será que o padre é da Oposição? Admirem-se...

Mas onde ele me parte todo é quando diz que «apesar de Jesus ter dito que não veio para abolir a Lei de Moisés, o Mestre faz algumas correções...». Depois veem os exemplos: «Vós ouvistes o que foi dito: 'Olho por olho e dente por dente! (...) Jesus nos aconselha – diz o sacerdote - a não reagir com a mesma forma de ofensa, pelo contrário, o certo é nem reagir, e até facilitar a ação ofensiva do agressor».

Assim está bem, senhor padre. Vou já reduzir mais 10% da minha renuneração e aumentar o IVA e os preços dos bens essenciais em vez de esperar pelo aumento que ainda está “a ser estudado” para daqui a umas semanas.

Antes disso, porém, vou ler o Corão que me parece ser mais razoável. Acho que está na altura de me tornar muçulmano.
1ª imagem: de El Greco,expulsão dos vendilhões do templo
2ª imagem: foto de conflito entre religiosos no Santo Sepulcro

18.2.11

Revoluções e tecnologias

«Las nuevas tecnologías son una herramienta para luchar contra las dictaduras, pero no son nada si no hay detrás unos valientes que levanten la voz».

«La historia del cibermilitante Wael Ghonim, de 30 años, ilustra la importancia de esos nuevos actores que hacen temblar las dictaduras árabes.

A pesar de su alto cargo en la oficina de Google para Oriente Medio, con sede en los Emiratos, Wael fue secuestrado en plena calle a finales de enero por la policía secreta egipcia. Habían descubierto que, bajo el seudónimo de el shahid (mártir), ese egipcio había creado un perfil de Facebook para convocar, con mucho éxito, a manifestaciones contra la dictadura.


Además, administraba una página en honor de
Jaled Said (foto ao lado),
un joven bloguero asesinado por la policía en junio pasado en Alejandría».


Foto de Wael-Ghonim recortada do Facebook. Texto recortado AQUI

13.2.11

Porque hoje é domingo

Neste dia 13 de Fevereiro, celebram os católicos o «VI Domingo do Tempo Comum» onde se invoca uma afirmação de Jesus em que diz que não veio ao mundo para destruir a Lei de Moisés, egípcio, mas sim para dar-lhe pleno cumprimento.

No plano da política internacional, isto parece trazer algum sossêgo.

E mais terá dito o filho de Deus, que «quem praticar seus ensinamentos e ainda os ensinar aos demais irmãos, será considerado grande no Reino dos Céus» - nada que Sócrates não tivesse já dito a seus discípulos hoje colocados nas direcções e administrações de grandes empresas, eles que a outro reino não aspiram desde que um camelo tentou passar pelo buraco de uma agulha.

No domínio da política nacional, portanto, também não há razões de queixa.

Mas a coisa ganha contornos perigosos quando o filho do Pai, embalado pelo entusiasmo, acrescenta que « todo aquele que se encolerizar com seu irmão será réu em juízo; quem chamar 'patife' ao seu irmão, será condenado pelo tribunal; quem chamar o irmão de 'tolo' será condenado ao fogo do inferno...»
Graças a Deus, talvez, alguém inventou os sacerdotes ao oitavo dia da Criação, a fim de corrigirem o pendor catastrofista do Senhor, e assim trazerem alguma esperança às nossas almas. E aos nossos corpos.

De um deles recorto esta douta explicação: «Calma – diz o padre. - Para Deus nada é impossível! Pelos vistos, nunca mereceremos a salvação eterna. Porém, a salvação nos virá por meio da misericórdia infinita de Jesus. O que não quer dizer que podemos relaxar e continuar pecando... ».

Admitindo, embora, que o padre não está a confundir Jesus com o FMI, eu diria que o que o padre quer dizer é que as palavras do Salvador não são para se tomar à letra mas apenas para nos pressionar na medida das nossas possibilidades. Mas confesso que já me cansa ter que meter explicador sempre que tento ler as palavras de Deus.

Por estas e por outras como estas é que eu começo a acreditar na versão “snifada” do meu amigo Seringas que assim traduz palavras de Jesus:«Aquele que nunca picou, que chute a primeira... pedra!»

Nota final: Quem quiser ler a parte picante da citada homilia, pode consultar a versão integral e original AQUI

11.2.11

À espera dos militares (recuperado)


Não parece haver muitas dúvidas de que serão as Forças Armadas quem irá decidir, em última instância, o desfecho da revolta no Egipto. E a aparente neutralidade com que se tem posicionado, pode ser interpretada como distanciamento em relação ao poder instituído, antes de mais, e em relação a forças para-militares como a polícia que apoia o governo, o que denuncia aproximação em relação à Oposição. Às oposições!, entre as quais se identificam a "Irmandade Muçulmana" e a "Associação Nacional para a Mudança", de ElBaradei.

É provável que a Oposição esteja a aliciar e a negociar com as Forças Armadas no sentido de assegurar a sua colaboração e que estas estejam “a contar armas” no seu seio, e a aguardar o momento oportuno para intervir decisivamente. Se assim fôr, o que se espera é que as forças pró-governamentais não mostrem capacidade para oferecer qualquer resistência.

Ao contrário do pretendido pelos apoiantes de Mubarak*, o agravamento das tensões e a provocação violenta dos pro-governamentais, irão acelerar o processo, visto que tal situação colocará ao Exército o imperativo de intervir.
2011 Fev 03, às 09h30

* Segundo resistir.info, «Não há manifestantes nenhuns a favor de Mubarak. Há, sim, polícias à paisana e marginais por ela recrutados, armados e pagos».

Mubarak e o poder


A ver vamos quem ri no fim...
(Ainda que o fim seja apenas o princípio)

7.2.11

Greves e bom-senso

O ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, António Mendonça, apelou ao “bom-senso” e ao “sentido de responsabilidade” dos intervenientes.

Esperemos que José Sócrates o ouça!