A arrogância e agressividade com que os governantes actuais se referem às corporações e organizações profissionais (professores, médicos, sindicatos...) e às próprias instituições de poder que não são governo (Tribunais, Autarquias), num contexto que é muito mais de crise social e moral do que económica, trazem à memória os conceitos clássicos que enformaram os regimes mais injustos e autoritários, sempre contruídos com a argamassa da demagogia.
Exemplar é o que Maquiavel (sec. XV-XVI) recomendava aos governantes em “O Príncipe” e de cuja obra seguem breves passagens.
«… Convém notar que ao apoderar-se [do governo] de um país, o ocupante deve pensar em todas as crueldades que precisa de fazer e praticá-las imediatamente, de uma vez, para não ter de recorrer ao mesmo processo e, não as renovando, tranquilizar os homens e conquistá-los pelos seus benefícios.
(…) Convém fazer o mal todo de uma vez para que, por ser suportado durante menos tempo, pareça menos amargo, e fazer o bem pouco a pouco, para melhor se saborear»
E eu a pensar nos contratos precários, no congelamento de vencimentos, nos despedimentos, nos impostos, nos preços… Esta paródia dos aumentos brutais do preço da electricidade a que o Governo correspondeu com um aumento também brutal…, é um caso maquiavélico exemplar:
«Um príncipe [governante] sensato e prudente deve achar maneira de os seus súbditos terem necessidade dele e do Estado em todas as circunstâncias de fortuna ou infortúnio. Assim, ser-lhe-ão sempre fiéis».
Quanto às promessas eleitorais…
«Nunca faltaram a um príncipe [um governante] pretextos legítimos para justificar a sua falta de palavra. Seriam infinitos os exemplos, do tempo presente, demonstrativos de quantas promessas foram feitas em vão e reduzidas a nada pela infidelidade dos príncipes, e demonstrativas também de que as coisas correram melhor aos que melhor souberam representar o papel de raposa. Mas é indispensável saber ocultar esse pendor, disfarçá-lo bem. Os homens são tão simples e tão obedientes às necessidades do momento, que quem engana encontra sempre quem se deixe enganar»
Mas atenção: «As vitórias nunca são tão completas que o vencedor não precise de ter em consideração certas coisas, sobretudo a justiça. (…) Um dos remédios mais certos contra as conjuras é não ser odiado nem desprezado pelos populares».
Porém, fica o aviso: «Se é fácil persuadir os povos de uma coisa, torna-se difícil mantê-los nessa persuasão. Assim, há que proceder de tal sorte que, quando deixarem de acreditar, se possa obrigá-los a crer pela força».
Até porque: «Os homens são de tal natureza que, se recebem bem daqueles de que esperavam mal, [um ditador ou semelhante] se sentem mais gratos do que se sentiriam de qualquer outro modo; o povo amá-lo-á ainda mais do que se ele tivesse sido eleito».
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