14.10.10

O Chile, Deus e o Diabo

Os “resgatadores” cumpriram a sua missão”.
O presidente do Chile vai cumprir a dele?


Estiveram “com Deus e com o Diabo”. É como quem diz: com a esperança e com o medo. Esperança de que as autoridades, lá em cima, cumprissem o seu dever elementar de fazer tudo para encontrá-los e resgatá-los. Esperança de que os técnicos o conseguissem. Esperança em Deus, ao menos para alguns, para quem o desmoronamento só pode ter sido obra do Diabo. E medo: que o Diabo derrotasse outra vez Deus; que os técnicos falhassem; que as autoridades não se empenhassem o suficiente.

Mas se Deus não precisa de fazer nada em sua defesa porque a fé enriquece tanto com a sorte quanto com o azar, ou talvez mais com este, já o Presidente da República tem que dar sinais de amor ao seu eleitorado, se não for pelos actos que seja pelas palavras. E lá estava ele de alma e coração, omnipresente e eloquente, consciente de que milhões de pessoas em todo o mundo estavam a vê-lo e a promovê-lo.

Na euforia dos acontecimentos e nas circunstâncias de cansaço e improviso com que se dá menos-bem habitualmente, talvez se deva perdoar que se tenha sobreposto ao regresso do primeiro técnico de resgate apesar de serem estes os únicos que arriscaram a vida voluntariamente em todo este processo e de ser aquele que mais arriscou. Mas não pode ser levado à conta do entusiasmo a promessa repetida de melhorar as condições de trabalho dos mineiros e dos outros trabalhadores, designadamente os agricultores, pescadores, etc. Tanto mais que é um namoro que faz continuamente à classe trabalhadora, até para contrariar a imagem de empresário que é.

Promessas de emprego (um milhão), de melhoria de salário e defesa dos direitos dos trabalhadores, já são habituais nos seus discursos, tal como a invocação das «maravilhas» chilenas, dos símbolos patrióticos e dos valores religiosos.

Alguma coisa me diz que os mineiros e os trabalhadores em geral não alimentem “essa” esperança. A questão, dando de barato a sinceridade das suas palavras, é que é mais fácil fazer passar 33 mineiros por um tubo de 700 metros do que os ricos prescindirem da exploração dos necessitados. E Piñera conhece bem a pátria de Allende, a história e a realidade do seu país, os interesses em conflito, no Chile e nos países da região - para não ir mais longe.

Se ele está à espera da ajuda de Deus para fazer o milagre da conciliação, tire daí a esperança porque, como disse Jesus Cristo e a História demonstra, Deus não se mete em política: a Deus o que é de Deus; a Sebastián Piñera o que é de Piñera.

Por falar nisso: quem vai pagar o resgate dos mineiros? Os próprios mineiros e os outros trabalhadores! Esta é a lógica da qual Piñera não quererá resgatar os chilenos.

1 comentário:

Mar Arável disse...

Após o resgate

que se levantem do chão