26.11.17

Porque hoje é domingo (92)

Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo

Assim contou Jesus Cristo (Mateus 25:41) como “o Pai” trataria os seus filhos no chamado Juízo Final. Estou para ver como é que as homilias de hoje irão conciliar este deus do ódio com o deus do amor, do perdão, da caridade…

Eu sei, eu sei que não vão ter que explicar nada porque ninguém interrogará o sacerdote de serviço acerca das contradições da personagem. E ainda que o fizessem, há sempre a alegação da metáfora e tal.

Entretanto o medo faz o seu caminho silencioso como sangue venenoso no coração dos crentes ou, como a Igreja também lhes chama, os "tementes a Deus"!

19.11.17

Oportunidade para Angola

Devido, em grande parte, à redução do preço do petróleo no mercado mundial, a economia angolana passa por uma das suas piores crises.

É o resultado talvez inevitável em qualquer país que tenha andado a nadar em petróleo quando este valia ouro, descuidando a diversificação da economia para fazer face à desvalorização da sua fonte de riqueza mais generosa.

A semelhança entre Angola e a Venezuela nesta matéria, por exemplo, é não só o choque económico mas também o choque político decorrente daquele. A diferença está na resposta que um e outro país dão ou não dão ao problema. A diferença, enfim, é que Angola parece estar a dar uma resposta inteligente.

Nicolás Maduro pode ter lido Karl Marx, tal como José Eduardo dos Santos e João Lourenço, embora sem a profundidade destes, mas contentou-se com as teses da luta de classes e da ditadura do proletariado. Não desenvolveu o Pensamento Económico. Eduardo dos Santos, é certo, desenvolveu-o a seu jeito…

João Lourenço, o novo presidente de Angola, está a adoptar medidas correctivas das práticas políticas e sociais, tão ajustadas como inusitadas. Se é por causa da crise económica e das exigências do Fundo Monetário Internacional (FMI), com vista a um futuro programa de apoio, dir-se-ia que “há (alguns) males que vêm por bem”.

Os constrangimentos a que terá que submeter-se para satisfazer a senhora Christine Lagarde (FMI) de tão má reputação na Europa e na América Latina, são conhecidos e reiterados: “é importante tentar reduzir a grande presença do Estado na economia”. Segundo ela, existe um programa de reestruturação de empresas públicas angolanas que inclui o encerramento de 48 e a privatização de outras 53...

Em todo o caso, o povo angolano não há-de estar disponível para uma nova forma de colonização e poderá criar, na complexidade dialéctica deste processo, uma nova e fecunda oportunidade.

12.11.17

Porque hoje é domingo (91)


Para quem, como eu, dormiu em remotas aldeias de Angola, onde a casa do soba tinha quartos para várias jovens e onde os outros homens dormiam em dias diferentes com mulheres diferentes segundo uma escala rigorosa, isto da poligamia nas civilizações primitivas – civilizações virgens, digamos – não tem novidade. Já para não invocar a tese de Karl Marx segundo a qual a monogamia nunca existiu.

Mas a Igreja, na homilia deste domingo, irá dar a volta ao texto em que Mateus nos fala, com naturalidade, de poligamia cultural em grande escala e virgens ansiosas pela chegada do esposo.

“Do alto inacessível das suas alturas”, como dizia António Gedeão, os virtuosos sacerdotes tanto podem servir-se do episódio para falar de azeite como para falar de prudência ou do que lhes der na gana sacerdotal, mas o que se invoca é o texto seguinte (Mateus 25:1-13).


1 Então o reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo.
2 E cinco delas eram prudentes, e cinco "loucas".
3 As loucas, tomando as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo.
4 Mas as prudentes levaram azeite em suas vasilhas, com as suas lâmpadas.
5 E, tardando o esposo, tosquenejaram todas, e adormeceram.
6 Mas à meia-noite ouviu-se um clamor: Aí vem o esposo, saí-lhe ao encontro.
7 Então todas aquelas virgens se levantaram, e prepararam as suas lâmpadas.
8 E as "loucas" disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite, porque as nossas lâmpadas se apagam.
9 Mas as prudentes responderam, dizendo: Não seja caso que nos falte a nós e a vós, ide antes aos que o vendem, e comprai-o para vós.
10 E, tendo elas ido comprá-lo, chegou o esposo, e as que estavam preparadas entraram com ele para as bodas, e fechou-se a porta.
11 E depois chegaram também as outras virgens, dizendo: Senhor, Senhor, abre-nos.
12 E ele, respondendo, disse: Em verdade vos digo que vos não conheço.
13 Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora em que o Filho do homem há de vir.

11.11.17

A palavra "democracia"

Ao ver como Mariano Rajoy reprime violentamente os independentistas provocadores no fraudulento referendo da Catalunha, como prende opositores políticos e como ele invoca a Constituição Espanhola para justificar tudo isso, bem como a manipulação despudorada da televisão pública (TVE) na forma como lida com o conflito entre os independentistas e os nacionalistas, desfaz-se qualquer dúvida sobre a hipocrisia com que o governo espanhol persegue os governantes venezuelanos, de Chavez a Maduro, por prenderem opositores políticos com pretextos comparáveis.

O mesmo se poderia dizer, rigorosamente, dos critérios democráticos de Donald Trump e dos governantes da europa ocidental, quanto à forma como tratam a China em comparação com a forma como tratam Cuba e outras ditaduras úteis.


AP Photo/Alex Brandon de Abril 2017

7.11.17

Cheque ao rei Filipe VI


Qualquer coisa me diz que a crise política da Catalunha tem pouco a ver com Rajoy mas tudo a ver com Filipe VI.

Independência e república, as reivindicações do movimento independentista, não são tanto questões da competência do chefe de governo mas sobretudo do domínio do chefe de estado: soberania e regime.

Disto deu sinal o rei quando proferiu um discurso severo em 3 de Outubro. Onde disse "Estamos viviendo momentos muy graves para nuestra vida democrática" deve ler-se "... para nuestra vida monarquica".

Outro sinal, este vindo de Rajoy, é a frase que este usa sempre para responder às pretensões dos independentistas: "Não posso! É contra a constituição". Ora "não posso" é diferente de "não quero". Ainda que Rajoy não possa nem queira, entenda-se, ele invoca o chefe do estado em matéria de competência e invoca a constituição em matéria de legitimidade - que outra coisa se esperaria que fizesse?

Enquanto torres, cavalos e bispos partidários protegem Rajoy, este protege o rei e Puigdemond procura juntar as pedras que tem e as que ainda não tem. E o jogo continua, felizmente em ambiente desportivo.