Não tenho que preocupar-me em ser sério mas sim eficiente. As minhas virtudes são pueris; o meu sucesso económico, se o alcançar, esse sim é a minha glória. Sou uma criação do Estado para servir o Estado.
Eu não sou um homem com sentimentos e necessidades próprias, com valores e dignidade, membro solidário de uma sociedade; eu sou um instrumento produtivo, uma máquina, se necessário sou também um guerreiro, uma arma; eu faço parte das forças produtivas e o meu valor é aferido pelo rendimento que dou no mercado de trabalho, eu sou mercadoria.
Foi para isso que fui instruído na escola - não para aprender a viver ou a sobreviver, mas sim para aprender a produzir, a render na profissão que me couber. Não fui ensinado a lidar com a minha saúde, com as leis que me regem e com os caminhos da vida; fui ensinado a cuidar da saúde das empresas, dos interesses dos empresários e da captação de lucros. Nem medicina nem filosofia – engenharia e comércio.
Não perguntem a um médico como se opera um rasgão no seu casaco; não perguntem a um engenheiro como se constroi uma relação feliz; não perguntem a um economista como se alimenta e vive uma família cujos rendimentos não chegam para as despesas elementares. Eles têm coisas “mais importantes” para fazer – a bem do país, por assim dizer.
Um dia deixarão de ser doutores e engenheiros, funcionários competentes, colaboradores indispensáveis. Dar-se-ão conta disso quando lhes chamarem reformados ou, antes disso, excedentários”.
Sobreviventes ao prazo de validade, fantasmas do sistema, máquinas ferrugentas, estorvos do Serviço Nacional de Saúde, serão um problema para o Governo resolver. Não me admira que os nosso governantes, às ordens de quem os governa, porventura, decretem numa noite destas, em segredo:
Ninguém será cremado ou sepultado após a sua morte. O seu corpo será lançado no mercado, orgão a orgão, depois de avaliado, para ajudar a pagar as dívidas e alcançarmos o ajustamento de que “o país” tanto necessita.
Ficam dispensados desta obrigação, aqueles cujas famílias indemnizem o Estado para o efeito, através de uma multa de X milhares de euros.
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