4.3.12

Solução para a crise

O que se faz actualmente na União Europeia, a pretexto de eliminar o prejuízo ("défice") e combater o desemprego, não alcança um objectivo nem o outro – aumenta as dívidas dos países membros, cria e aprofunda a recessão económica, favorece o desemprego, degrada as remunerações e condições dos trabalhadores.

Mas, se não tivesse vantagens para ninguém, este caminho não seria iniciado ou prosseguido. Por alguma razão os seus autores e actores lhe chamam política responsável!

O facto é que esta estratégia configura uma nova etapa, uma segunda vaga no projecto CEE/União Europeia.

A primeira vaga tratou de construir uma muralha ideológica para defesa do capitalismo contra o socialismo. Como afirmava na sua imprudência verbal, a ex-ministra Manuela Ferreira Leite, «O chamado “estado social” surgiu como necessidade da Europa fazer frente a um bloco comunista que era necessário combater, sendo que não era possível fazê-lo criando riqueza e não dar protecção social aos trabalhadores. Isto ocorreu a seguir à 2ª Guerra Mundial, na Europa em geral, e em Portugal depois da instauração da Democracia». (1)

Esgotados os recursos artificiais e virtuais com que o capitalismo pagava a sua propaganda de bem-estar, houve que iniciar um novo ciclo estratégico: assumir a crise económico-financeira como um efeito incontornável do devir histórico, da Globalização, e culpabilizar directamente os países pobres da região e os seus trabalhadores – os PIGS, os preguiçosos e, na linguagem de Passos Coelho, os “piegas”. Foi assim como amarrar um tipo e, depois, acusá-lo de não sair do sítio. No essencial, enfim, tratou-se de encobrir a fraqueza do sistema.

A estratégia foi facilitada, há que mencioná-lo, com a derrota do domínio soviético que não teve a mesma habilidade ou capacidade de sobrevivência à crise mundial dos anos oitenta. Mas também é verdade que o processo gerou de facto um nível de desenvolvimento económico e de vida das populações que deixou a experiência do “socialismo real” sem argumentos convincentes para defender-se, resistindo apenas, politicamente, na medida da repressão interna.Se a derrocada soviética abria espaço, aparentemente, para a expansão dos interesses da União Europeia, já os interesses nacionais e até as raízes do socialismo – os interesses da classe trabalhadora - continuavam a opor-se às suas pretensões desmesuradas. E para arrefecer ainda mais a ambição da nova europa, assiste-se com pasmo à rápida emergência de novas potências, os BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China).

Nada que leve a entornar o caldo da UE quando a sua missão evangelizadora pode manter-se intacta. Afinal, nada disto põe em perigo o capitalismo e a hegemonia dos países do Norte da Europa. Pelo contrário, a chegada da China ao casino vem até reforçar o prestígio do sistema. Mais, vem até favorecer as políticas de degradação das condições de remuneração e trabalho dos europeus – muito conveniente!.

Até que, de repente, alguém repara nos cadáveres apinhados pelas ruas, isto é, nas filas de desempregados, nas filas de empresas falidas, nas filas de casas à venda, nas filas de pobres envergonhados…, e pergunta: e agora quem é que compra os produtos que nós temos para vender, quem é que deposita as suas poupanças nos nossos bancos, quem é que paga os nossos juros, quem é que paga impostos?

Ufa, estas reflexões deprimem-me. Que diabo, nós não estamos em 1929. Para esquecer tudo, entro no hotel mais alto de onde espero desfrutar  uma vista relaxante, e peço um quarto no último andar. O empregado, com irrepreensível  profissionalismo, quer saber:
- É para dormir ou para se atirar da janela?

Só então compreendi que, afinal, há uma solução para a crise do capitalismo.

(1) Março 2012 TVI – Programa “Olhos nos Olhos” 

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