Destacamento militar da Cabaca / Angola
A nossa guerra era de sobrevivência, não só às armas mas também ao tédio, ao cansaço, à aviação inimiga (os mosquitos), e às minas antipessoais mais irascíveis (que não as mais perigosas) - as malditas matacanhas e as formigas mordedoras.
Também havia as outras minas, é claro, as instantâneas e letais, e não se passou o tempo todo sem termos disso a prova e as vítimas, como se invoca nesta lápide onde inscrevi a legenda que invoca uma morte. (O militar que posa para a foto que recortei da Net, esse não conheço).*
Naqueles tempos em que a vida dos portugueses - até ao último soldado, como dizia Salazar - não valia nada em comparação com a propriedade das colónias, a rádio emitia uma espécie de hino onde se cantava "Angola é nossa". A expressão ainda hoje me causa calafrios.
Em vez de proclamar que Angola era nossa, sendo que todos os que me rodeavam - talvez todos - estariam dispostos a vender ou a dar a sua parte!, eu inscrevia muito discreta e inutilmente na pala do meu boné (o quico), a sigla A.P.A. que queria dizer "Angola Para os Angolanos". Ainda não era um posição anti-americana e menos ainda anti-soviética, era tão simplesmente anti-colonial - na minha cabeça e no meu cérebro apenas, visto que quase ninguém mais sabia o significado...!
Hoje que Angola se esforça por aumentar os níveis de exportação de petróleo que foram drasticamente reduzidos nos últimos meses, é caso para colocar-se esta questão filosófica: sendo o petróleo angolano uma componente do seu (sub)solo, importá-lo, apropriá-lo, é uma forma de colonização? Paradoxalmente, é o contrário.
No entanto, aquela era a leitura forçada que faziam os anti-comunistas acerca do apoio da União Soviética ao povo colonizado de Angola, assim como viria a acontecer com o apoio de Cuba e com o próprio apoio a Cuba por parte da URSS. A questão, portanto, não está no que se aliena mas sim na liberdade e no interesse legítimo de o fazer.
Não sei o que é que a União Soviética ou Cuba ganharam com o apoio que deram nas lutas de libertação de Angola, mas sei que foi com a sua ajuda que o hino colonial ganhou uma versão muito mais digna: «Angola é nossa, é nossa irmã»!
Pena é que esta fraternidade não beneficie da mesma maneira todos os membros da grande família angolana que é suposto ser o seu povo, mas nem os titulares das lutas de libertação escapam à moral do capitalismo quando esse é o sistema que preconizam.
Notas:
O militar que posa junto da lápide deve ser da Companhia que nos foi render. Recortei a foto na Net.
A menina que aparece na última foto é Isabel dos Santos, filha primogénita do presidente angolano.
1 comentário:
Boa memória
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