Chame-se Museu Salazar ou Centro Interpretativo blá blá, não
é por chamar gato ao cão que este começa a miar. O projecto não podia ser menos
oportuno.
Tratando-se de "apenas e só fazer um levantamento
científico e histórico de um regime político, enquanto acontecimento factual",
onde cabe a designação de centro interpretativo?
Um dos argumentos que se lançam a favor da iniciativa é o
valor da “imparcialidade”. Cumpre prevenir os incautos de que a justiça não é imparcial
quando condena um criminoso mas sim quando o julga. Reconhecido o crime, a
sociedade deixa de tolerar o infractor. E o crime hediondo que constituiu o
regime do Estado Novo foi julgado e condenado em 25 de Abril de 1974. E não é
reabilitável! Isto sem acrescentar que é prudente, sempre, pensar duas vezes
antes de aceitar declarações de imparcialidade!
Das mesmas bandas intelectuais dos defensores do museu de
Salazar – ou é só razões turísticas que pretendem criá-lo na terra do ditador? – emana o
argumento de que a sua obstrução seria contrária à liberdade de expressão. Aqui fingem ignorar que o maior inimigo das liberdades é o abuso. E que esses abusos
perigosos para a sociedade não podem evitar-se apenas com as leis democráticas
mas carecem também de práticas democráticas, nomeadamente a oposição aos
avanços ideológicos fascizantes.
Há quem alegue que “a Democracia não pode ter medo dos
autoritarismos e totalitarismos que procura atacar, nem dos seus eventuais
defensores”. Mas é precisamente dos autoritarismos e totalitarismos
que a Democracia deve ter medo – esse medo-útil que avisa dos perigos!
Pior que tudo, há quem finja que as correntes fascizantes não
têm eco na opinião pública. Como se as Marine Le Pen da Europa ou os Bolsonaros
da América do Sul fossem fenómenos insignificantes – refiro-me aos votos que os
elegeram, mais do que a eles próprios.