2014 foi o ano em que me desapareceram os colegas Semião Ramos, Helena Santos e Olga Almeida. Um ano trágico, considerando a grande estima que tinha por cada um deles. Um desaparecimento absurdo que mostra como a vida é absurda. A não ser que haja Além onde nos possamos reencontrar um dia.
A minha razão diz que esse Além é tão absurdo como a morte, mas eu que não acredito em “Deus”, quero acreditar no meu poeta de estimação que dizia “os pássaros, quando morrem, caem no céu». É que os meus amigos que desapareceram, tinham asas – sentimentos generosos, fantasias fascinantes, sonhos de outro mundo.
Ao vê-los partir, compreendo como nunca, outra coisa que dizia o José Gomes Ferreira – que «Viver sempre, também cansa».
Costumo dizer que não acredito no “outro mundo”, mas não quero que o ano acabe sem confessar que também não acredito neste!
31.12.14
28.12.14
TAP não anda nem desanda
Agora a sério...
Três sindicatos “que em conjunto representam mais de 50% dos trabalhadores da TAP, mantêm a greve, acatando, no entanto, a requisição civil decretada”.
O que eu não entendo é que interesse tiveram e que sentido faz a suspensão da greve por parte dos outros sindicatos, uma vez que o Governo decretou autoritariamente a requisição civil.
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24.12.14
O Papa e este outro mundo
O Mundo está mudado, o mundo social. Não falo das diferenças
circunstanciais como haver mais ou menos pobres, mais ou menos analfabetos, mais ou menos acesso aos cuidados de saúde; falo do controlo dos poderes, da transparência dos capitais, da independência da Justiça, da participação dos cidadãos nas decisões dos estados.
A denúncia e o combate que o Papa Francisco faz em relação aos comportamentos reprováveis que observa nos doutores do Vaticano, além de real é simbólico destas mudanças porque ocorre na mais conservadora instituição do mundo ocidental.
O discurso e a atitude do Papa, dirigido aos bispos nas vésperas do Natal de 2014,fez lembrar Jesus a expulsar, do Templo de Jerusalém, os cambistas e comerciantes que usavam a “casa do Pai” para fazer os seus negócios, chamando-lhes “salteadores”…
Quando o Papa exaltou os homens e mulheres “invisíveis”, os trabalhadores anónimos, e fez notar que o cemitério está cheio de figuras prestigiadas que se consideravam insubstituíveis, é toda a mensagem social dos evangelhos que emerge do bafiento discurso tradicional e contemporizador em que a Igreja se tem acobardado e beneficiado materialmente.
Se o “conclave” que elegeu o argentino Bergoglio, em Março de 2013, esperava dele o mesmo papel que desempenhou João Paulo II, levando desta vez a uma reversão do curso progressista da América Latina, enganaram-se. O que acabámos de ver há escassos dias, foi uma aproximação entre os EEUU e Cuba com intermediação do Papa Francisco. A favor do regime político cubano? Não. A favor da paz mundial e do bem-estar das populações “invisíveis” que são as vítimas das guerras quentes e frias.
A denúncia e o combate que o Papa Francisco faz em relação aos comportamentos reprováveis que observa nos doutores do Vaticano, além de real é simbólico destas mudanças porque ocorre na mais conservadora instituição do mundo ocidental.
O discurso e a atitude do Papa, dirigido aos bispos nas vésperas do Natal de 2014,fez lembrar Jesus a expulsar, do Templo de Jerusalém, os cambistas e comerciantes que usavam a “casa do Pai” para fazer os seus negócios, chamando-lhes “salteadores”…
Quando o Papa exaltou os homens e mulheres “invisíveis”, os trabalhadores anónimos, e fez notar que o cemitério está cheio de figuras prestigiadas que se consideravam insubstituíveis, é toda a mensagem social dos evangelhos que emerge do bafiento discurso tradicional e contemporizador em que a Igreja se tem acobardado e beneficiado materialmente.
Se o “conclave” que elegeu o argentino Bergoglio, em Março de 2013, esperava dele o mesmo papel que desempenhou João Paulo II, levando desta vez a uma reversão do curso progressista da América Latina, enganaram-se. O que acabámos de ver há escassos dias, foi uma aproximação entre os EEUU e Cuba com intermediação do Papa Francisco. A favor do regime político cubano? Não. A favor da paz mundial e do bem-estar das populações “invisíveis” que são as vítimas das guerras quentes e frias.
23.12.14
A ideologia dos materiais
ou: O embargo embargado
Comecemos pelo óbvio! Quando se mudou o nome à ponte sobre o Tejo, a ponte não mudou. Em tudo permaneceu igual, desde a localização à função, à estrutura e à constituição material.
Também o petróleo bruto russo não se tornou mais nem menos bruto quando implodiu a União Soviética. Quando a ideologia política de Cuba mudou a partir de 1959, o açúcar de cana não passou a ser mais doce nem os frangos passaram a nadar como lagostas…
O processo reformador em curso (PREC?) na República de Cuba, a “reforma do estado” ou, na linguagem local, os novos “lineamientos”, de resto iniciados no congresso do PCC de Abril de 2012, pretende introduzir reformas económicas, sociais e políticas destinadas ao desenvolvimento económico do país.
Estas mudanças, especificamente, incluem uma série de medidas que aproximam mais a sociedade do modelo económico vigente nos países capitalistas. Nomeadamente, trata-se da captação de maior investimento estrangeiro, especialmente na área do turismo mas também em tecnologia. E no domínio laboral, “aumentar a produtividade do trabalho, elevar a disciplina e o nível de motivação do salário e estímulos, eliminando o igualitarismo nos mecanismos de distribuição e redistribuição do rendimento.”
No Sábado, 20 de Dezembro, ocorreu em Havana um debate parlamentar sobre a concretização destas políticas, no qual se manifestaram, entre outras, as preocupações do sector privado e do sector sindical.
É evidente que tudo isto será enormemente facilitado com a “normalização de relações” entre Cuba e os Estados Unidos da América. Mas o que parece uma vantagem para o regime, por esta via, comporta um cruzamento de negócios, de culturas e de conceitos sociais que desmistificam o que tem há de excessivo na interpretação marxista-leninista dos dirigentes cubanos - ou o que houve!
O desenvolvimento económico joga a favor de um país, independentemente do regime em vigor. Mas também os EUA aproveitariam muito, ou aproveitarão, dos investimentos e trocas comerciais com Cuba.
A ponte que agora começa a ser construída entre estas duas margens da História americana, chamem-lhe o que chamarem, interessa a todos!
Comecemos pelo óbvio! Quando se mudou o nome à ponte sobre o Tejo, a ponte não mudou. Em tudo permaneceu igual, desde a localização à função, à estrutura e à constituição material.
Também o petróleo bruto russo não se tornou mais nem menos bruto quando implodiu a União Soviética. Quando a ideologia política de Cuba mudou a partir de 1959, o açúcar de cana não passou a ser mais doce nem os frangos passaram a nadar como lagostas…
O processo reformador em curso (PREC?) na República de Cuba, a “reforma do estado” ou, na linguagem local, os novos “lineamientos”, de resto iniciados no congresso do PCC de Abril de 2012, pretende introduzir reformas económicas, sociais e políticas destinadas ao desenvolvimento económico do país.
Estas mudanças, especificamente, incluem uma série de medidas que aproximam mais a sociedade do modelo económico vigente nos países capitalistas. Nomeadamente, trata-se da captação de maior investimento estrangeiro, especialmente na área do turismo mas também em tecnologia. E no domínio laboral, “aumentar a produtividade do trabalho, elevar a disciplina e o nível de motivação do salário e estímulos, eliminando o igualitarismo nos mecanismos de distribuição e redistribuição do rendimento.”
No Sábado, 20 de Dezembro, ocorreu em Havana um debate parlamentar sobre a concretização destas políticas, no qual se manifestaram, entre outras, as preocupações do sector privado e do sector sindical.
É evidente que tudo isto será enormemente facilitado com a “normalização de relações” entre Cuba e os Estados Unidos da América. Mas o que parece uma vantagem para o regime, por esta via, comporta um cruzamento de negócios, de culturas e de conceitos sociais que desmistificam o que tem há de excessivo na interpretação marxista-leninista dos dirigentes cubanos - ou o que houve!
O desenvolvimento económico joga a favor de um país, independentemente do regime em vigor. Mas também os EUA aproveitariam muito, ou aproveitarão, dos investimentos e trocas comerciais com Cuba.
A ponte que agora começa a ser construída entre estas duas margens da História americana, chamem-lhe o que chamarem, interessa a todos!
21.12.14
Porque hoje é domingo (64)
Tão difícil como plantar-se o fantasma de Maria no cimo duma azinheira, e tão difícil como ter Jesus nascido de uma virgem, é que um anjo tenha ido (de onde?) até Belém para ter uma conversa séria com a Senhora… de Fátima. Mas foi. Mas falou. Mas era mesmo um anjo. Dizem.
Não é difícil imaginar a cena. Estando Maria a pensar na tristeza de vida que levava, é surpreendida por um ser incorpóreo, espiritual, destituído de boca, portanto, que lhe fala e diz «Olá, eu chamo-me Gabriel e sou um anjo». E antes que a senhora caísse de susto, atalhou Gabriel com um largo sorriso na sua boca de anjo: «Alegra-te, muito favorecida! O Senhor é contigo». Desta fala nos dá conta Lucas, evangelista, no versículo 28 do primeiro capítulo.
«Ai Jesus!», diria ela se o nomeado já fosse nascido ou sequer anunciado. Mas, em vez disso, deu-lhe a perturbação para se pôr a pensar, diz o mesmo evangelista, no que significaria aquela saudação.
Antes que a senhora começasse a dar asas à imaginação, o anjo pôs as cartas na mesa dizendo (versículos 30 e 31): «Maria, não temas; porque achaste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho a quem chamarás pelo nome de Jesus».
Não me perguntem o que teria ela a temer por Gabriel lhe dizer que o Senhor estava com ela. De temer, de entrar em pânico, isso sim, eram as palavras que o anjo pronunciou a seguir… para a acalmar: «conceberás e darás à luz um filho»! Não porque a senhora não quisesse ter um filho, não se sabe, mas porque nunca tinha feito nada nem deixado fazer que o justificasse.
Acredito que a senhora tenha ponderado se em algum momento, inadvertidamente, teve contacto com fluido fecundador de homem, o que a levou a defender-se: «Como será isto, pois não tenho relação com homem algum?»
O anjo vinha preparado para essa pergunta, e logo respondeu, apaziguador: «Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isso também o ente santo que há-de nascer, será chamado Filho de Deus». E, mais adiante, acrescentou a voz: « … para Deus não haverá impossíveis em todas as suas promessas». Ao que Maria terá respondido (vers. 38): «Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra». O anjo deu-se por satisfeito e «se ausentou dela» que é como quem diz “voltou pelo caminho que o trouxe”.
Como se fosse preciso dar algum sentido a esta história inverosímil, houve necessidade de contar como foi que José reagiu. Disso se encarregou o evangelista Mateus (I,18-19, Bíblia de Jerusalém) que inventou mais um anjo para acalmar o noivo de Maria e compensando-o com o título de santo e, mais tarde, de padroeiro da classe operária.
Não é difícil imaginar a cena. Estando Maria a pensar na tristeza de vida que levava, é surpreendida por um ser incorpóreo, espiritual, destituído de boca, portanto, que lhe fala e diz «Olá, eu chamo-me Gabriel e sou um anjo». E antes que a senhora caísse de susto, atalhou Gabriel com um largo sorriso na sua boca de anjo: «Alegra-te, muito favorecida! O Senhor é contigo». Desta fala nos dá conta Lucas, evangelista, no versículo 28 do primeiro capítulo.
«Ai Jesus!», diria ela se o nomeado já fosse nascido ou sequer anunciado. Mas, em vez disso, deu-lhe a perturbação para se pôr a pensar, diz o mesmo evangelista, no que significaria aquela saudação.
Antes que a senhora começasse a dar asas à imaginação, o anjo pôs as cartas na mesa dizendo (versículos 30 e 31): «Maria, não temas; porque achaste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho a quem chamarás pelo nome de Jesus».
Não me perguntem o que teria ela a temer por Gabriel lhe dizer que o Senhor estava com ela. De temer, de entrar em pânico, isso sim, eram as palavras que o anjo pronunciou a seguir… para a acalmar: «conceberás e darás à luz um filho»! Não porque a senhora não quisesse ter um filho, não se sabe, mas porque nunca tinha feito nada nem deixado fazer que o justificasse.
Acredito que a senhora tenha ponderado se em algum momento, inadvertidamente, teve contacto com fluido fecundador de homem, o que a levou a defender-se: «Como será isto, pois não tenho relação com homem algum?»
O anjo vinha preparado para essa pergunta, e logo respondeu, apaziguador: «Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isso também o ente santo que há-de nascer, será chamado Filho de Deus». E, mais adiante, acrescentou a voz: « … para Deus não haverá impossíveis em todas as suas promessas». Ao que Maria terá respondido (vers. 38): «Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra». O anjo deu-se por satisfeito e «se ausentou dela» que é como quem diz “voltou pelo caminho que o trouxe”.
Como se fosse preciso dar algum sentido a esta história inverosímil, houve necessidade de contar como foi que José reagiu. Disso se encarregou o evangelista Mateus (I,18-19, Bíblia de Jerusalém) que inventou mais um anjo para acalmar o noivo de Maria e compensando-o com o título de santo e, mais tarde, de padroeiro da classe operária.
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19.12.14
"Cherchez la femme" Clinton
O fogo de artifício que justamente brilha no continente americano, com a eliminação do bloqueio imposto pelos Estados Unidos a Cuba, deixa na sombra uma figura que pode ter sido mais influente na decisão de Obama do que o próprio Papa Francisco. Essa figura é Hillary Clinton.
O facto é que a ex-Secretária de Estado norte-americana publicou, em Junho deste ano, um livro auto-biográfico onde conta, a dada altura, ter aconselhado o presidente Barack Obama a pôr fim ao bloqueio a Cuba!
Além de aspectos mais pessoais, o livro aborda vários temas de política internacional em relação aos quais nem sempre ela esteve de acordo com o Presidente. Recorde-se que Obama a nomeou para o cargo depois de a ter derrotado no seio do Partido Democrata, no contexto das eleições presidenciais.
Esta última circunstância ainda coloca aos observadores a questão da eventual candidatura de Hillary à Presidência em 2016, o que, dada a posição conhecida sobre as relações com Cuba, seria um desfecho tranquilizador para os irmãos Castro se ainda forem vivos.
Muitos "ses", é certo, mas também uma confirmação: a frase de Alexandre Dumas (pai) «Há sempre uma mulher envolvida em todos os casos. Assim que me trazem um relatório, digo logo: 'Procurem a mulher'».
O facto é que a ex-Secretária de Estado norte-americana publicou, em Junho deste ano, um livro auto-biográfico onde conta, a dada altura, ter aconselhado o presidente Barack Obama a pôr fim ao bloqueio a Cuba!
Além de aspectos mais pessoais, o livro aborda vários temas de política internacional em relação aos quais nem sempre ela esteve de acordo com o Presidente. Recorde-se que Obama a nomeou para o cargo depois de a ter derrotado no seio do Partido Democrata, no contexto das eleições presidenciais.
Esta última circunstância ainda coloca aos observadores a questão da eventual candidatura de Hillary à Presidência em 2016, o que, dada a posição conhecida sobre as relações com Cuba, seria um desfecho tranquilizador para os irmãos Castro se ainda forem vivos.
Muitos "ses", é certo, mas também uma confirmação: a frase de Alexandre Dumas (pai) «Há sempre uma mulher envolvida em todos os casos. Assim que me trazem um relatório, digo logo: 'Procurem a mulher'».
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18.12.14
"Todos somos cubanos"
A proximidade geográfica da super-potência norte-americana é tão apelativa para Cuba e os cubanos, quanto a hostilidade do “império” é repugnante para os irmãos Castro e seus seguidores. Assim se estabelece uma relação de amor-ódio que vem da revolução de 1958 e que ganha relevo especial em dois momentos históricos – a invasão norte-americana da Baía dos Porcos, em 1961, e o embargo económico dos Estados Unidos a Cuba, fixado em lei a partir de 1992.
O embargo norte-americano não se aplicava, digo, não se aplica apenas aos Estados Unidos; ele estabelece fortes sanções económicas e diplomáticas aos países que tenham negócios ou transações relacionadas com a ilha de Fidel Castro. E tem sido condenado sucessivamente por organizações internacionais em que se destaca, nomeadamente, a Organização das Nações Unidas em dezenas de vezes. Só os próprios EUA e Israel defendem a continuação do bloqueio.
Vale a pena registar, a propósito da intervenção do Papa Francisco no processo agora desencadeado por Obama, que até João Paulo II condenou o bloqueio em 1979 e em 1998.
Além de vontade e coragem política, Obama tem responsabilidades e condições históricas novas para decidir o restabelecimento de “relações normais” entre os dois países vizinhos. O “perigo soviético” já não existe, a ideologia “comunista” do governo cubano não é argumento – veja-se a relação com a China! – e a família Castro vai cedendo às “leis da vida” e da História, impotente para travar as tecnologias da informação e a globalização da economia.
Entre a opinião da comunidade internacional, e a pressão de muitos dissidentes cubanos, entre a incompreensão dos americanos democratas e o ódio do Tea Party, entre a estratégia do isolamento, que vigorou 50 anos sem sucesso, e a estratégia da porosidade em que deposita esperanças de contaminação democrática, Obama sentiu-se animado a avançar para o restabelecimento de relações diplomáticas e outras medidas associadas.
Entre estas medidas está a autorização de vendas e exportações de bens e serviços dos EUA para Cuba! A perspectiva de uma evolução do regime cubano que desenvolva abertura comercial não estará ausente na consideração dos Estados Unidos da América.
No extremo, Cuba poderá ser terreno virgem para a exploração de oportunidades económicas. E no plano das relações multinacionais, a influência perdida da América do Norte, no sul do continente, fonte inesgotável de petróleo e matérias-primas e posto político estratégico, muito menos terão sido indiferentes ao "novo capítulo entre as nações das Américas". É que, como ele agora descobriu e fez questão de enfatizar, "Todos somos americanos"!
É que, a prosseguir a política agressiva e imperialista tradicional, e a ter significado a radicalização dos eleitorados mundiais, a administração norte-americana corre o risco de ouvir dizer: "Todos somos cubanos"!
O embargo norte-americano não se aplicava, digo, não se aplica apenas aos Estados Unidos; ele estabelece fortes sanções económicas e diplomáticas aos países que tenham negócios ou transações relacionadas com a ilha de Fidel Castro. E tem sido condenado sucessivamente por organizações internacionais em que se destaca, nomeadamente, a Organização das Nações Unidas em dezenas de vezes. Só os próprios EUA e Israel defendem a continuação do bloqueio.
Vale a pena registar, a propósito da intervenção do Papa Francisco no processo agora desencadeado por Obama, que até João Paulo II condenou o bloqueio em 1979 e em 1998.
Além de vontade e coragem política, Obama tem responsabilidades e condições históricas novas para decidir o restabelecimento de “relações normais” entre os dois países vizinhos. O “perigo soviético” já não existe, a ideologia “comunista” do governo cubano não é argumento – veja-se a relação com a China! – e a família Castro vai cedendo às “leis da vida” e da História, impotente para travar as tecnologias da informação e a globalização da economia.
Entre a opinião da comunidade internacional, e a pressão de muitos dissidentes cubanos, entre a incompreensão dos americanos democratas e o ódio do Tea Party, entre a estratégia do isolamento, que vigorou 50 anos sem sucesso, e a estratégia da porosidade em que deposita esperanças de contaminação democrática, Obama sentiu-se animado a avançar para o restabelecimento de relações diplomáticas e outras medidas associadas.
Entre estas medidas está a autorização de vendas e exportações de bens e serviços dos EUA para Cuba! A perspectiva de uma evolução do regime cubano que desenvolva abertura comercial não estará ausente na consideração dos Estados Unidos da América.
No extremo, Cuba poderá ser terreno virgem para a exploração de oportunidades económicas. E no plano das relações multinacionais, a influência perdida da América do Norte, no sul do continente, fonte inesgotável de petróleo e matérias-primas e posto político estratégico, muito menos terão sido indiferentes ao "novo capítulo entre as nações das Américas". É que, como ele agora descobriu e fez questão de enfatizar, "Todos somos americanos"!
É que, a prosseguir a política agressiva e imperialista tradicional, e a ter significado a radicalização dos eleitorados mundiais, a administração norte-americana corre o risco de ouvir dizer: "Todos somos cubanos"!
16.12.14
O capitalismo é generoso
Das notícias:
Sobre a “prenda” de 14 milhões de euros dada pelo construtor José Guilherme a Ricardo Salgado, Manuel Fernando Espírito Santo disse na Comissão de Inquérito que não achava normal.
Manuel Fernando admitiu que foi decidido dar aos membros do Conselho Superior uma retribuição especial, “a título dos ganhos obtidos nos contratos dos submarinos” (...) O gestor diz que o dinheiro (um milhão de euros para cada ramo da família) foi pago em 2004 ou 2005 por uma empresa ligada à Escom para uma sociedade sua na Suíça.
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14.12.14
Porque hoje é domingo (63)
Na primeira leitura de hoje, o profeta Isaías, apresenta-se com a missão de anunciar a Boa-Nova às pessoas que sofrem por causa das injustiças, da pobreza, de prisões, perseguições; e de anunciar o ano da graça do Senhor.
Em um momento em que tudo parecia perdido e o povo não tinha mais ânimo para retomar o caminho para reconstruir a nação, e começar de novo, esse profeta vem cantando e falando de coisas novas que Deus... fará! Ele anuncia uma nova era.
Entretanto, nestes vinte séculos passados, o mundo continuou como antes a roubar os fracos, a explorar os pobres, a matar os inocentes, a discriminar as mulheres, a entronizar os demagogos… Ficou por cumprir a caridade e a justiça, o pão e a igualdade – que já nem se exigia o Céu, seja lá o que isso for além da estrada em que circulam os aviões da TAP.
Entre nós, heróis do mar e destino turístico predilecto de Nossa Senhora, o que mais se assemelha ao profeta, por enquanto, é António Costa, do Partido Socialista, com sua Boa Nova em costrução. Mas, qual João Baptista, ele deixa entender que “não é ele a luz mas que veio apenas anunciar a luz” - a luz terá que ser ligada em Bruxelas e Berlim, em resultado de um incerto movimento revolucionário que irá mudar o sentido dos ventos. Entretanto, continuamos às escuras.
Em um momento em que tudo parecia perdido e o povo não tinha mais ânimo para retomar o caminho para reconstruir a nação, e começar de novo, esse profeta vem cantando e falando de coisas novas que Deus... fará! Ele anuncia uma nova era.
Entretanto, nestes vinte séculos passados, o mundo continuou como antes a roubar os fracos, a explorar os pobres, a matar os inocentes, a discriminar as mulheres, a entronizar os demagogos… Ficou por cumprir a caridade e a justiça, o pão e a igualdade – que já nem se exigia o Céu, seja lá o que isso for além da estrada em que circulam os aviões da TAP.
Entre nós, heróis do mar e destino turístico predilecto de Nossa Senhora, o que mais se assemelha ao profeta, por enquanto, é António Costa, do Partido Socialista, com sua Boa Nova em costrução. Mas, qual João Baptista, ele deixa entender que “não é ele a luz mas que veio apenas anunciar a luz” - a luz terá que ser ligada em Bruxelas e Berlim, em resultado de um incerto movimento revolucionário que irá mudar o sentido dos ventos. Entretanto, continuamos às escuras.
12.12.14
11.12.14
A Esquerda que temos
Fotos: Catarina Martins, Ana Drago e Joana Amaral Dias.
Não basta dizer “Podemos”, para poder. Não basta dizer-se “Livre”, para sê-lo. Não basta chamar-se Bloco, para ser uno e consistente. Não basta pescar umas frases na corrente de opinião, copiar umas ideias avulsas na doutrina marxista, e refrescar o imaginário da Esquerda com derivas de estilo. Se a esquerda ainda está a fazer caminho na História, não é por falta de estilo e menos ainda por falta de imaginação literária ou de criatividade figurativa.
É claro que os processos e estilos de comunicação dos actores políticos no espaço público, são fundamentais para persuadir e mover as populações. Já Aristóteles o ensinava. Mas política não é poesia! O conhecimento, a experiência e a capacidade de organização é que são determinantes na acção política. Juntar tudo isto com a retórica numa mesma pessoa, faz de um político um ser excepcional. Álvaro Cunhal foi um exemplo raro deste modelo. Que tivesse contra si o tempo histórico, não diminui o seu mérito.
No panorama actual da política portuguesa, o PCP é, a meu ver, o mais consistente e consequente partido de esquerda, mas Jerónimo de Sousa não tem imagem nem estilo nem retórica nem dimensão intelectual para interpretar a realidade social além da divisão das classes; para exprimir os anseios populares, além do vocabulário sindical; para desconstruir a narrativa dominante, além da cacofonia; para imprimir um impulso dinamizador no processo revolucionário que paira fragmentado na sombra do sistema vigente.
Jerónimo tem a generosidade, a dedicação e a experiência de trabalho revolucionário que o distinguem positivamente de outros activistas de esquerda, e tem sobretudo o apoio e enquadramento organizado de um partido que não transige com o oportunismo político. Mas além das carências a que me refiro atrás, e duma visão estreita sobre amigos e inimigos – burgueses, traidores, folhas secas… - não tem coragem intelectual para clarificar os fins e os meios do seu modelo de sociedade. Assim sendo, o PCP é uma fonte de desconfiança.
Nestas condições, o PCP deixa que o espaço de Esquerda fique entregue a uma constelação de meteoros academicamente brilhantes, que vão dos mais frágeis conglomerados aos marmóreos mais flexíveis, ficando os respectivos eleitores a escolher entre loiras e morenas à falta de outras diferenças.
Não basta dizer “Podemos”, para poder. Não basta dizer-se “Livre”, para sê-lo. Não basta chamar-se Bloco, para ser uno e consistente. Não basta pescar umas frases na corrente de opinião, copiar umas ideias avulsas na doutrina marxista, e refrescar o imaginário da Esquerda com derivas de estilo. Se a esquerda ainda está a fazer caminho na História, não é por falta de estilo e menos ainda por falta de imaginação literária ou de criatividade figurativa.
É claro que os processos e estilos de comunicação dos actores políticos no espaço público, são fundamentais para persuadir e mover as populações. Já Aristóteles o ensinava. Mas política não é poesia! O conhecimento, a experiência e a capacidade de organização é que são determinantes na acção política. Juntar tudo isto com a retórica numa mesma pessoa, faz de um político um ser excepcional. Álvaro Cunhal foi um exemplo raro deste modelo. Que tivesse contra si o tempo histórico, não diminui o seu mérito.
No panorama actual da política portuguesa, o PCP é, a meu ver, o mais consistente e consequente partido de esquerda, mas Jerónimo de Sousa não tem imagem nem estilo nem retórica nem dimensão intelectual para interpretar a realidade social além da divisão das classes; para exprimir os anseios populares, além do vocabulário sindical; para desconstruir a narrativa dominante, além da cacofonia; para imprimir um impulso dinamizador no processo revolucionário que paira fragmentado na sombra do sistema vigente.
Jerónimo tem a generosidade, a dedicação e a experiência de trabalho revolucionário que o distinguem positivamente de outros activistas de esquerda, e tem sobretudo o apoio e enquadramento organizado de um partido que não transige com o oportunismo político. Mas além das carências a que me refiro atrás, e duma visão estreita sobre amigos e inimigos – burgueses, traidores, folhas secas… - não tem coragem intelectual para clarificar os fins e os meios do seu modelo de sociedade. Assim sendo, o PCP é uma fonte de desconfiança.
Nestas condições, o PCP deixa que o espaço de Esquerda fique entregue a uma constelação de meteoros academicamente brilhantes, que vão dos mais frágeis conglomerados aos marmóreos mais flexíveis, ficando os respectivos eleitores a escolher entre loiras e morenas à falta de outras diferenças.
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7.12.14
Porque hoje é domingo (62)
É inevitável nesta altura invocar as quatro "Cartas da Prisão" escritas pelo apóstolo Paulo.
A primeira lição a seguir para quem escreva cartas da prisão, é a forma simpática e generosa como se dirige aos destinatários: «Que a graça e a paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo estejam convosco».
A segunda lição , para quem incarna um ministério religioso ou profano, é centrar o assunto na salvação do Povo e não - muito menos de forma exclusiva - na sua salvação pessoal.
Mas o que mais me intriga, pelo conteúdo, é perceber se as epístolas que S. Paulo escreveu - ou ditou - do cárcere, se dirigiam mesmo aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses e a Filémon, ou se almejavam chegar... até nós.
Deixo à vossa consideração esta passagem de uma dessas cartas : (...) o Espírito Santo, que é a garantia da nossa herança, enquanto esperamos a completa libertação(...)
Já me pareceria forçado demais invocar os versículos 26 a 28: «Se vos irardes, não pequeis; o Sol não se ponha sobre a vossa ira. Não deis ocasião ao diabo. Quem roubava, não roube mais».
A primeira lição a seguir para quem escreva cartas da prisão, é a forma simpática e generosa como se dirige aos destinatários: «Que a graça e a paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo estejam convosco».
A segunda lição , para quem incarna um ministério religioso ou profano, é centrar o assunto na salvação do Povo e não - muito menos de forma exclusiva - na sua salvação pessoal.
Mas o que mais me intriga, pelo conteúdo, é perceber se as epístolas que S. Paulo escreveu - ou ditou - do cárcere, se dirigiam mesmo aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses e a Filémon, ou se almejavam chegar... até nós.
Deixo à vossa consideração esta passagem de uma dessas cartas : (...) o Espírito Santo, que é a garantia da nossa herança, enquanto esperamos a completa libertação(...)
Já me pareceria forçado demais invocar os versículos 26 a 28: «Se vos irardes, não pequeis; o Sol não se ponha sobre a vossa ira. Não deis ocasião ao diabo. Quem roubava, não roube mais».
5.12.14
Sócrates, Juvenal... e eu !
"Quis custodiet ipsos custodes?"é uma frase em latim que pode ser traduzida de várias formas: "Quem vigia os vigilantes?", "Quem vigia os vigias?", "Quem fiscaliza os fiscalizadores?", "Quem guarda os guardas?"…
José Sócrates, na sua quarta carta da prisão, adoptou a última destas traduções – a mais corrente – mas os guardas a que se referia eram expressamente os juízes e os polícias, jornalistas, políticos e professores de Direito.
A questão filosófica colocada por José Sócrates, foi título do meu “post” de 2 de Junho de 2008,a propósito dos Estados Unidos manterem “suspeitos de terrorismo” para interrogatório, em prisões flutuantes, a fim de não serem denunciadas como ilegais nos territórios onde fossem mantidos. Mais recentemente, a propósito da expulsão de magistrados portugueses que trabalhavam em Timor-Leste, escrevi “Quem Julga os Juízes”e, “já agora”, Juvenal colocava a mesma questão, no primeiro século da era cristã.
Recordo que Juvenal é o poeta e filósofo romano que criticou os seus contemporâneos de se satisfazerem com “pão e circo”(panem et circenses) depois de se terem tornado escravos de prazeres corruptores.
Está pois o ex-Primeiro Ministro muito bem acompanhado na sua visão crítica da Sociedade - passe a imodéstia...
José Sócrates, na sua quarta carta da prisão, adoptou a última destas traduções – a mais corrente – mas os guardas a que se referia eram expressamente os juízes e os polícias, jornalistas, políticos e professores de Direito.
A questão filosófica colocada por José Sócrates, foi título do meu “post” de 2 de Junho de 2008,a propósito dos Estados Unidos manterem “suspeitos de terrorismo” para interrogatório, em prisões flutuantes, a fim de não serem denunciadas como ilegais nos territórios onde fossem mantidos. Mais recentemente, a propósito da expulsão de magistrados portugueses que trabalhavam em Timor-Leste, escrevi “Quem Julga os Juízes”e, “já agora”, Juvenal colocava a mesma questão, no primeiro século da era cristã.
Recordo que Juvenal é o poeta e filósofo romano que criticou os seus contemporâneos de se satisfazerem com “pão e circo”(panem et circenses) depois de se terem tornado escravos de prazeres corruptores.
Está pois o ex-Primeiro Ministro muito bem acompanhado na sua visão crítica da Sociedade - passe a imodéstia...
1.12.14
Sócrates livre
Quem faz declarações públicas, há-de esperar comentários públicos. Não serei eu a frustrar as expectativas.
Ao dizer, da prisão, que se sente “mais livre do que nunca”, José Sócrates está a filosofar em torno do conceito de liberdade, porventura inspirado em Kierkegaard, este mesmo discípulo do outro Sócrates. Com efeito, creio que foi aquele filósofo dinamarquês quem disse que “nem todos os que riem das algemas são livres”. Se não foi ele, foi outro ou nenhum porque na verdade eu apanhei a frase no filme “Doutor Jivago”, de Boris Pasternak, onde um preso que é transportado de comboio, responde com aquela frase ao polícia que o leva algemado!
Fica bem a José Sócrates, enfim, este exercício filosófico que coloca a questão de alguém "ser" livre ainda que "esteja" preso - a diferença entre ser e estar. E mais pode acrescentar, invocando agora um comentário de João Cravinho, que “o PS não está preso” mas a voar para o próximo Governo.
Fica aqui e assim a minha modesta contribuição para a confusão geral.
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